Começaremos o
presente artigo com uma indagação: é cabível a
caracterização
do regime
de sobreaviso
ao empregado que recebe um telefone celular da empresa, para uso
exclusivo
desta?
A priori,
a melhor resposta será DEPENDE.
Com
objetivo de esclarecer
a questão, mister se faz definir
o que vem a ser o adicional de sobreaviso.
Previsto no art.
244, §2º da CLT, trata-se de um acréscimo salarial destinado
inicialmente aos ferroviários – frisa-se, que a Consolidação das
Leis do Trabalho data de 1943, que poderiam ser acionados por seu
empregador durante seu intervalo interjornadas (entre as jornadas),
em decorrência de um atendimento de emergência, como o caso de
acidente na via.
Dessa forma, não
poderiam estes empregados se afastarem de seus lares, os quais, via
de regra, eram às margens da ferrovia, ficando, assim, ao alcance de
seu empregador.
Por óbvio, isto
gera uma lesão a liberdade de locomoção do ferroviário, que não
poderia gozar de seu descanso plenamente, motivo pelo qual urge por
uma compensação, no caso, o adicional de sobreaviso.
Como já dito, a CLT
foi sancionada em 1943, época em que as estradas de ferro eram
amplamente utilizadas no país, e os meios de comunicações eram
limitados. A título de ilustração, de acordo com disposto na
Wikipédia1,
a primeira rede de telefonia celular brasileira foi criada no Rio de
Janeiro, através da TELERJ, no ano de 1990, o que afasta qualquer
hipótese de sua previsão no Codex.
“Com a evolução
da sociedade, outros ramos de atividade vieram a reclamar, também,
atendimentos de emergência, para os quais se faz necessário que os
trabalhadores permaneçam em estado de vigília. Os meios de
comunicação existentes nos dias atuais, por sua vez, permitem que o
empregado seja convocado em qualquer local que se
encontre.” 2
Ante a esta
mitigação no cerceamento da liberdade do trabalhador, posto que não
mais precisava se encontrar em sua residência para ser localizado
pelo empregador, o Tribunal Superior do Trabalho, por intermédio do
verbete sumular de nº 428 – antiga OJ 49 do SDI-1, determinou que
o mero uso de aparelho de intercomunicação, incluso aqui o telefone
celular, não configura o regime de sobreaviso:
“SOBREAVISO
(conversão da Orientação Jurisprudencial n.º 49 da SBDI-1) - Res.
174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
O
uso de aparelho de intercomunicação,
a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado,
por si só,
não caracteriza o regime de sobreaviso,
uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando,
a qualquer momento, convocação para o serviço.” (Súmula n° 428
do TST)
Ocorre que, este
mesmo Tribunal, no Recurso de Revista nº
TST-RR-38100-61.2009.5.04.0005, entendeu que não contraria a súmula
retro, a configuração do regime de sobreaviso para o
empregado que é obrigado a manter seu telefone móvel ligado durante
todo o período de descanso interjornada, bem como era habitualmente
convocado para o trabalho neste período.
“HORAS
DE SOBREAVISO. REGIME CONFIGURADO. OBRIGATORIEDADE DE O EMPREGADO
MANTER O CELULAR LIGADO DURANTE O PERÍODO DE DESCANSO ENTRE
JORNADAS. Não contraria a Súmula n.º 428 desta Corte superior
decisão em que se reconhece o direito do autor à percepção das
horas de sobreaviso em hipótese em que confessado pelo preposto da
reclamada a obrigatoriedade de o empregado manter o celular ligado
durante o seu período de descanso entre jornadas, e em que havia
efetiva convocação habitual do obreiro para o trabalho. Recurso de
revista de que não se conhece.” (Recurso de Revista nº
TST-RR-38100-61.2009.5.04.0005 -
A ausência de
entendimento pacífico e cristalizado sobre o tema se mostra
evidente. De fato, em uma interpretação sistemática da súmula e
do julgado, vemos que não há contradição entre eles, vez que o
verbete sumular fala em “por si só”, ou seja, o uso de aparelho
celular pelo empregado poderá caracterizar o regime de sobreaviso,
desde que seu embasamento não seja somente o seu uso.
Por outro lado, o
Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região – Rio de Janeiro,
entendeu através de acordão proferido em Recurso Ordinário, que o
estado de vigília imposto pela empresa, onde o empregado se vê
obrigado a monitorar a bateria de seu aparelho, a qualidade do sinal,
a distância entre o local em que pretende ir e o seu local de
trabalho, infringe não só a liberdade de locomoção, como o
direito ao descanso, urgindo por uma contraprestação:
“SOBREAVISO.
ESTADO DE VIGÍLIA. Embora o uso de
aparelho celular, rádio e similares não restrinja totalmente a
liberdade de locomoção do empregado, há que se reconhecer a
relativa limitação sofrida nos seus horários destinados ao
descanso, já que a possibilidade de ser
chamado à empresa a qualquer tempo faz com que o trabalhador tenha
que se preocupar com sinal, baterias e, também, a distância que se
encontra do local de trabalho. Este estado de
vigília resulta na ampliação do poder de comando do empregador em
detrimento da liberdade no gozo do tempo livre pelo empregado,
devendo corresponder a uma
contraprestação.”
(RO-0104600-25.2005.5.01.0461, DOERJ
05/8/2010, 10a Turma, Rel. Marcos Cavalcante. - TRT1)
Controvérsias a
parte, correto é afirmar que, a obrigatoriedade imposta ao obreiro
de portar e utilizar algum aparelho para comunicação imediata com
seu empregador em seu período de descanso, sem o auferimento de uma
contraprestação por isto, acarretará um enriquecimento ilícito do
empregador.
Por oportuno, menciona-se a velha máxima do direito do trabalho: "trabalho feito, é salário garantido". Dessa forma, ainda que no caso concreto, o empregado não receba o adicional de sobreaviso, deverá o tempo dispendido com a empresa através do aparelho ser contabilizado como hora de labor e, portanto, acaso ultrapasse o contratualmente estipulado, será remunerado como labor extraordinário.
Por oportuno, menciona-se a velha máxima do direito do trabalho: "trabalho feito, é salário garantido". Dessa forma, ainda que no caso concreto, o empregado não receba o adicional de sobreaviso, deverá o tempo dispendido com a empresa através do aparelho ser contabilizado como hora de labor e, portanto, acaso ultrapasse o contratualmente estipulado, será remunerado como labor extraordinário.
Rio de Janeiro, 02
de setembro de 2012.
Eduardo F. Filippo
1http://pt.wikipedia.org/wiki/Celular
2Acordão
proferido no RO-0104600-25.2005.5.01.0461 – TRT1.
Nenhum comentário:
Postar um comentário